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CRIANDO ASAS

"A gente não cria os filhos para a gente, nós os criamos para eles mesmos. Quando eu ficar sozinha, estarei seguindo o destino de todas as mulheres". (Clarice Lispector para o Jornal do Brasil, em 1968)

Tudo começa assim: um belo dia, seu filho vira para você e diz “mãe, pai, quero morar fora” ou “vou casar”. As situações são diversas, porém todas são, em sua maioria, acompanhadas da máxima repetida constantemente - “criamos o filho para o mundo”. No entanto, a saída de casa dos filhos é sempre acompanhada de muitas dúvidas, receios e insegurança. A maioria dos casais tem a sensação de “ninho vazio” e costumam ficar bastante perdidos nesse período de mudança, também conhecido como “desmame”. Afinal, foram anos e anos, horas e horas dedicadas às vontades e necessidades dos filhos. Muitos casais, inclusive, costumam anular seus desejos em função de suas crias.

Esquece-se de investir na relação a dois, e em si próprio. Quando percebem que esses filhos já estão mais independentes, e querem alçar voo próprio, têm que conviver com sentimentos dúbios, como o orgulho pelo dever cumprido e, ao mesmo tempo, certa angústia por não poder mantê-los sob suas asas. Para compreender essa sensação de “ninho vazio”, a psicanalista Dra. Claudia Mascarenhas Fernandes ressalta que é necessário entender primeiro o que leva uma pessoa a ter um filho. “Normalmente, um filho acontece na vida de alguém quando essa pessoa quer alguma coisa a mais da vida. Isso pode aparecer para a pessoa de diversas formas, mas de modo geral, se trata de um desejo inconsciente para completar algo que se sente faltando.

 

Costuma-se chamar isso de uma grande vontade de dar mais amor, de perpetuar a família”, afirma a psicanalista. Ter um filho tem, assim, uma relação direta com o desejo e com a satisfação. Segundo Dra. Claudia Mascarenhas Fernandes, o chamado “ninho vazio” é justamente um retorno a esse desejo que impulsionou a vontade de ter o filho. “O vazio que retorna é o vazio que estava antes de ter o filho e motivou a vinda dele ao mundo”, destaca. A médica Rita Oliveira e seu marido viveram essa experiência com o filho caçula. Aos 18 anos, ele passou no vestibular para Engenharia Elétrica na Universidade Federal de Florianópolis e foi morar longe de casa. “Para mim, foi uma grande falta. Primeiro, porque era o mais novo; segundo, porque eu era super protetora, tinha muito medo dessa fase de adolescência, 

 

jovens se envolvem mais com drogas e bebidas. Por ele estar longe de mim, não poderia ver nada”, conta. Após dois anos, ela afirma tentar superar a saída do filho de todas as maneiras, ajudando-o no que for necessário. Por outro lado, ela afirma que a relação com seu esposo foi intensificada, permitindo uma maior proxi midade entre o casal. “Nossos programas são sempre nossos agora. E apesar de termos outra filha em casa, ela fica muito fora e trabalhamos muito também”, destaca. Rita costuma, até mesmo, incentivar outros pais a deixarem seus filhos saírem de casa. Uma forma, segundo a médica, de eles aprenderem a assumir responsabilidades. A funcionária pública Lorena Ramos - mãe de Sophia (12 anos) e Raffael (16 anos) - acaba acompanhar a saída de casa do seu primogênito para fazer um intercâmbio de 10 meses no Canadá, e concorda que esse desmame é 

muito positivo. “Ver o filho feliz é nosso maior presente. Perceber o amadurecimento dele, a experiência de vida adquirida, o ganho profissional em quaisquer que sejam suas escolhas de vida, a abertura de horizontes, a oportunidade de viver um primeiro distanciamento físico da casa dos pais, de uma forma leve. O que serve para todos da família. De negativo, são as saudades”, garante Lorena.

 

Segunda lua de mel

O momento em que o filho cria asas é também a hora de investir em uma vida familiar saudável, sobretudo para o casal. “É interessante falar sobre isso, porque os casais não se dão conta, na construção da relação deles (porque toda relação é uma construção, não nasce pronta e nem cai do céu), que é preciso fazer um esforço ou pelo menos estar bastante atento à ideia de que é interessante ter um espaço para uma vida de casal”, afirma Dra. Claudia Mascarenhas Fernandes. Para a psicanalista, atualmente, com tantas demandas e exigências sociais, o espaço do casal vai para o espaço. Ou seja, nunca saem juntos sozinhos, nunca jantam a sós, nunca vão a um cinema ou qualquer coisa que gostem. É interessante, entretanto, que isso faça parte do cotidiano, como reservar um tempo para uma boa conversa, para divertir-se juntos. “A erótica do casal, que é também importante, acontece normalmente se há esse espaço e, por isso, a cama do casal, por exemplo, precisa ser só deles”, diz a especialista. A psicóloga Dora Marinho passou por essa experiência ao acolher a decisão de sua filha única Clara que, aos 20 anos, decidiu cursar a Faculdade de Psicologia, na Universidade Federal do Rio de Janeiro. “A ausência dela na minha rotina me afetou como mãe e mulher. Existia um vazio muito grande. Por outro lado, para mim e meu marido foi um grande momento de encontro”, destaca. Segundo Dora, a ocasião em que o filho se afasta é um desafio para a mulher casada, que tem um parceiro. “Por ter um lado materno muito forte, a prioridade da mulher vai ser o filho, e nem sempre pode ser o filho. Então, aquele casal percebe que só tem os dois. E aí, o que a gente vai fazer?”, questiona-se. Essa é, com certeza, uma ocasião para recriar, dividir o prazer a dois e dar-se prazer. “Eu vivi isso, até mesmo porque era meu segundo casamento. Quando eu casei com meu atual marido, Clara tinha 12 anos. Existia esse impacto. Então, nos permitimos cuidar mais um do outro e oportunizar coisas boas, como tomar um vinho, aprofundar diálogos e, consequentemente, rever a relação”, conta. Para Dora, o retorno da sua filha para casa foi ainda melhor, porque ela já tinha criado asas e permitido esse espaço entre o casal: “Não tinha mais aquele lugar de ‘filhinha’”. Como ressalta Dra. Claudia Mascarenhas Fernandes, “cuidem das suas vidas para além da vida dos filhos. Os pais que resumem suas satisfações da vida vivendo a vida dos filhos certamente sofrerão muito mais nesse momento. Não é raro que possam sem se dar conta até dificultar essa saída, mesmo que seja muito benéfica para os filhos”, destaca. E quando esses pais se casam e têm filhos muito cedo, assumindo, assim, uma série de compromissos e responsabilidades, o voo das crias funciona como um tempo necessário e precioso de redescoberta para o casal. Manuela Almeida e seu esposo tiveram sua primeira filha aos 17 anos e 18 anos, respectivamente. Hoje, com dois filhos (Luana, 24 anos, e Luiz Henrique, 20 anos) já crescidos, estão experimentando uma fase importante para a relação, com mais liberdade e tranquilidade. “Eu e meu marido vivemos em constante lua de mel, como ele costuma dizer. Tenho também me curtido muito. Sou pedagoga, mas depois que meus filhos cresceram, decidi fazer uma nova faculdade, realizar esse sonho. Hoje, trabalho com o que gosto, sou designer de interiores”, afirma. Manuela acredita que, na relação pais e filhos, o mais importante é, sobretudo, a confiança: “Deixar voar e saber que eles têm um ninho para sempre voltar”.

 

 



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