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iGENERATION

Como compreender e lidar com adolescentes ultra conectados?

Como bem observado pelo jornalista e sociólogo Muniz Sodré, pode parecer um tanto presunçoso iniciar uma conversa recorrendo à etimologia das palavras, mas, por outro lado, a etimologia é capaz de revelar-se muito oportuna na revisão conceitual de algumas questões. Tratando-se da palavra “adolescência”, sua origem do latim ad (a, para) e olescer (crescer) significaria processo de crescimento. “Adolescer” surge também da palavra “adoecer”, do latim adolescere, que remete a enfermar. “Adoecer”, nesse sentido, por envolver uma série de transformações físicas e psíquicas, do turbilhão emocional à condição de desenvolvimento própria dessa fase da vida. Compreende-se, dessa maneira, a adolescência como algo natural no processo de crescimento, sendo inclusive um assunto atemporal e recorrente nas famílias. Porém, lidar com as emoções nesse período é sempre um dilema para os pais. Sobretudo, atualmente, quando esses jovens são constantemente afetados por uma enxurrada de informações acessíveis a um simples touch. É a chamada geração Z (iGeneration) - que inclui pessoas nascidas entre 1995 e 2005 - atrelada a valores como independência, inclusão, diversidade, etc., etc.

Uma geração ultra conectada, engajada e inovadora. De acordo com o psicólogo e doutor em Ciências da Educação, Alessandro Marimpietri, até algum tempo atrás, a adolescência tinha suas fronteiras marcadas pela puberdade (mudanças físicas) e pelo discurso legal, caracterizando-se como uma fase da vida entre a infância e a idade adulta.  Os adolescentes da iGeneration são frutos de um tempo medido, essencialmente, pelo status online. Nasceram em plena revolução das redes sociais que modificou as formas de comportamento e o acesso à informação.

Como resultado, esses jovens são bastante dinâmicos, criativos, críticos, contestadores e ansiosos. Justamente por isso, eles se sentem mais donos de si, e assim não costumam gostar de hierarquia e determinadas regras impostas pelos pais, dentre elas, por exemplo, a difícil tarefa de cumprir rotinas. É comum ouvir os pais se queixarem desse imediatismo exigido pelos filhos e, pode-se falar também, de certo individualismo. Um estudo chamado Linkers – A nova geração de consumidores - feito em 2014 pela Câmara de Dirigentes Lojistas de Porto Alegre (RS) - destaca justamente essa contradição na geração Z. Se por um lado, eles são bastante autênticos, por outro lado, tendem a se fechar em seu próprio mundo, sofrendo com a solidão e frustrações resultantes das grandes expectativas que suas mentes ativas almejam. Segundo o estudo, é uma geração silenciosa que não abre mão de um bom fone de ouvido e smartphone (de preferência o último lançamento do mercado), instrumentos essenciais para a conexão com o mundo virtual - que é tão natural e acolhedor para eles.

Outro aspecto observado por Marimpietri é que a adolescência está mais elástica, começando cada vez mais cedo, terminando cada vez mais tarde. “Essa fase acaba se convertendo no objetivo de vida de toda uma sociedade: viver intensamente, livre e feliz, identificados com a juventude”. Talvez seja por isso que os pais se sintam em uma encruzilhada: não perder a mão dando liberdade demais, sendo permissivos demais e, até mesmo, confundindo a relação pais e filhos com uma troca entre amigos; e, por outro lado, mantê-los na “linha”, impondo limites ao assumirem seus papeis como pais com a autoridade necessária a esse momento tão pulsante da vida. “Vivemos um tempo  paradoxal: os adolescentes são exigidos demais e permitidos demais. Nunca eles foram tão priorizados e nunca foram tão cobrados em performances, disciplina, criatividade, felicidade, sucesso e etc.”, ressalta Marimpietri. 

Em seu canal no You Tube, Marimpietri costuma abordar uma série de assuntos que envolvem a trabalhosa relação entre pais e filhos, sobretudo, temas ligados à educação, adolescência associados aos contextos contemporâneos, como bullying e novas tecnologias. Em suas conversas, inclusive, o psicólogo costuma observar e chamar a atenção para uma significativa diferença entre autoridade e autoritarismo. O especialista reforça: “Autoridade é diferente de autoritarismo. A primeira se refere a um pacto simbólico silencioso, uma aposta do desejo dos pais que ajuda muito esses filhos a se desenvolverem. Autoritarismo é quando usamos força demais para submeter alguém à nossa lógica ou lei: isso é violento, desnecessário e ineficaz”.

 

O CAMINHO PARA UM DIÁLOGO SAUDÁVEL

Como, então, seria possível construir positivamente um convívio com a indispensável autoridade? Recorrendo a um ditado popular, “falar é fácil”, mas, quando os pais se veem diante da série de mudanças físicas e psíquicas associadas à adolescência, percebem o quanto é desafi ador estabelecer uma ponte saudável. Para o psicólogo e especialista em Saúde Mental, Thiago Monteiro, muitas vezes, esse movimento se evidencia no adolescente com um rompimento de suas antigas afinidades familiares e com identificações aos seus novos grupos sociais. Essa prática é natural, necessária e importante para a construção da identidade dos jovens. Entretanto, em muitos casos, traz diversos obstáculos na abertura de diálogos, o que cria um desafio enorme para os pais. “O nível com o qual esse vínculo será afetado irá variar de acordo com a relação previamente estabelecida naquele contexto familiar”, ressalta Monteiro. Tais mudanças no sistema familiar podem, em muitos casos, não ser encaradas com naturalidade ou facilidade pelos pais. Fala-se, até mesmo, numa certa carência percebida como um vazio. De acordo com Monteiro, os pais se dão conta de que ao focarem tanto e por tanto tempo apenas nos seus papeis de cuidadores, acabaram por negligenciar outras vertentes do seu ser. Consequentemente, “quando os filhos começam a isentá-los dessa responsabilidade, eles se deparam com a insegurança da realidade de retomarem as suas vidas, de focarem novamente em si mesmos como indivíduos”, destaca o psicólogo.

 

Sandy Najar, diretora da Revista Hot Days, assegura que, na relação com sua fi lha Emilie (15 anos) há uma preocupação em estabelecer um vínculo de confiança e amizade sem pretender assumir o papel de melhor amiga. “Eu quero ser a melhor amiga que uma mãe pode ser para uma filha”, afirma. Dentre as principais dificuldades no relacionamento,  reforça a árdua tarefa de compreender as mudanças de humor atreladas à ansiedade, ao imediatismo tão característicos da idade. Porém, conta que procura criá-la para que seja independente e alcance seus objetivos: “Eu cobro que ela seja uma boa aluna e principalmente uma boa pessoa em um tempo em que não se tem tanta tolerância em relação ao outro. Tento ensinar que ela precisa ter paciência, persistência e amor ao próximo. Não cobro o extremo, mas cobro dela a verdade sempre”. Em alguns momentos, admite que 

precisou privar o uso do celular, mas houve uma compreensão por parte da filha. Esse tempo offline, para a mãe de Emilie, é essencial. “Acho que eles são tão cobrados pelos grupos conectados às redes sociais, que cansam mentalmente. Eles não curtem o presente, ficam no digital. Minha filha já aprendeu um pouco, já tem essa consciência de que é mais importante realizar do que visualizar apenas”, afirma Sandy.

A administradora Carol Brandão, mãe de Rodrigo (16 anos), concorda sobre a importância de compreender a necessidade do filho adolescente de caminhar sozinho. “Dá um aperto no coração, uma saudade do tempo em que cabiam no nosso colo e que nosso abraço curava toda e qualquer dor e decepção”, relembra. Por outro lado, Carol se orgulha das atitudes do filho, do quanto ele amadureceu e aprendeu os princípios mais importantes que o tornará um adulto bem resolvido e responsável. “Sempre deixei ele muito à vontade, ouvi suas opiniões. Inclusive agora, quando ele começa a pensar qual profissão seguir, reforço que sua escolha seja por algo que sinta prazer em fazer. Caso contrário, se tornará um sacrifício”, afirma. Carol destaca, principalmente, que busca ser franca nas suas conversas e mostrar a vida real. Ela acredita que, por terem sidos pais jovens, ela e o marido conseguiram estabelecer com Rodrigo uma relação tranquila. Como consequência de certa proximidade entre gerações, há uma facilidade maior na compreensão dos desejos e dúvidas próprios do mundo atual, caracterizado pela efemeridade. “Sempre dei espaço para dar limites. A liberdade que damos nos mostra por onde devemos guiá-lo”, assegura.

Para o especialista Marimpietri, é imprescindível sustentar o inegociável, a frustração e o limite: “Adolescentes com pais pouco claros estão em maior risco”. Fórmula pronta não existe, porém, o segredo estaria justamente na construção diária dessa relação de parceria entre adultos e jovens, que deve ser estabelecida desde a infância. Um dos caminhos para os pais seria escutar o que os filhos adolescentes têm a dizer com palavras e gestos a fim de criar uma relação em meio às diferenças.

NEGOCIANDO COM AS NOVAS TECNOLOGIAS

Na escola, em casa, na rua, entre os amigos, os tablets, smartphones se tornaram verdadeiras próteses de todos nós. Quando se fala especialmente da iGeneration ou geração Z, a dose de bom senso com relação ao uso desses equipamentos e dessas informações tem sido bastante questionada pelos pais. Afinal, a tarefa de mediar e controlar o uso dessas novas interfaces tem sido bastante intensa. Esses garotos e garotas já acordam com gadgets na mão, ansiosos por mais uma postagem nas redes sociais, ansiosos para saberem o que está acontecendo nesse universo tão rico de informações acessíveis e 

atraentes capaz de confundir vidas real e virtual. É essencialmente essa necessidade de conexão frequente que preocupa os pais: “o que meu filho costuma visualizar? ”; ou “será que ele está postando coisas demais? ”. Essas, sem dúvida, são algumas questões. 

Vale ressaltar que esse não é um comportamento exclusivo dos adolescentes, uma vez que é reflexo das novas formas de socialidade contemporâneas. Mas tratando-se dos adolescentes de hoje, pode-se afirmar que é uma geração que já nasceu inserida nesse novo contexto em que real e virtual se misturam. Muitos pais, inclusive, assumem posturas radicais e retiram totalmente esses recursos por certos períodos da rotina dos seus filhos. Contudo, para o psicólogo Thiago Monteiro, essa exclusão pode apresentar reflexos negativos para a realidade dos jovens, assim como a sobrecarga do seu uso. “As redes sociais vêm dialogar diretamente com a realidade que esses jovens buscam vivenciar durante a adolescência, fortalecendo seu senso de identidade e pertença a uma comunidade”, destaca Monteiro.

O fato é que as novas tecnologias estão aí, não há como fugir, chegam como um facilitador para permitir que não existam mais restrições ou barreiras geográficas na busca pela socialização. Esses jovens – futuros adultos – nasceram e vão conviver, trabalhar em meio a essa profusão digital. Cabem aos pais impor limites justos para que essas novas mídias sejam positivas à formação desses futuros cidadãos. Na casa de Carol Brandão, a negociação é feita com confiança entre as partes, afirma: “Dei celular cedo para Rodrigo a fim de que soubesse que para tê-lo é preciso ter responsabilidade. Jogos online, rede social sempre estiveram presentes para que pudéssemos mostrar seus benefícios e perigos”. Entre os principais receios dos pais está a superexposição da vida privada desses jovens nas redes sociais. Tal superexposição é reflexo de um tempo em que a imagem é excessivamente valorizada. Não é à toa que o Instagram e o Snapchat com suas histórias ao vivo e o You Tube estão entre as preferidas pelo público adolescente. Muitos, sobretudo, sonham em ter um canal no You Tube, ser reconhecidos, conquistar milhões de seguidores e, assim, alcançar o status de digital influencer.

Segundo o psicólogo Alessandro Marimpietri, as tecnologias não fazem mal se forem usadas com parcimônia e auxílio gradual adulto. Condenável seria a superexposição as essas tecnologias. “Em geral, mais que duas horas por dia para aqueles entre 06 e 16 anos de idade já se faz risco. Os pais têm que colocar regras, como tudo na vida. Usar por um tempo aceitável, não trocar obrigação por diversão, mediar conteúdos impróprios. Por aí, seguiremos com saúde e os benefícios que a tecnologia nos oferece”, ressalta Marimpietri. A sugestão seria uma maior interação dos pais, não somente monitorando ou impondo limites, mas participando ativamente a fim de conhecerem e fazerem parte dessa nova realidade sócio virtual do filho. O resultado promete ser positivo, criando uma abertura entre pais e filhos, permitindo que ambos descubram juntos novas afinidades. Além disso, é imprescindível reconhecer a potência desse espaço virtual que vem contribuindo muito para um diálogo mais afirmativo de diversos temas, antes considerados tabus, como sexualidade, prevenção, acessibilidade, diversidade, igualdade de direitos, transparência. Assuntos caros para serem abordados em casa, na escola, entre amigos e familiares, que contribuem significativamente para a formação de adultos conscientes e responsáveis.

 

 



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